domingo, 22 de dezembro de 2013

Feliz 2014.

Olá pessoal 2013 foi um ano muito intenso para a cia Duo Encantado. Desbravamos São Paulo conhecendo os extremos da cidade. Seja na mata, nas vielas ou no asfalto o duo encantado vai estar la levando alegria e encantamento onde quer que seja. E que venha 2014!!

segunda-feira, 16 de dezembro de 2013

Histórias de Natal


Esta foi a primeira história de Natal que eu contei. Foi um exercício tão profundo que eu fiz, porque é uma história muito intensa e carregada de sentimentos e trata de questões tão importantes vivenciadas por uma menina. Sintam por vocês mesmos! Conto de Hans C. Andersen.

A pequena vendedora de fósforos


Foto 1. A pequena vendedora de fósforo, Projeto Encontros (estação Paraíso do metrô)

Era véspera de Natal. Fazia um frio intenso; já estava escurecendo e caía neve. Mas a despeito de todo o frio, e da neve, e da noite, que caía rapidamente, uma criança, uma menina descalça e de cabeça descoberta, vagava pelas ruas. Ela estava calçada quando saiu de casa, mas os chinelos eram muito grandes, pois eram os que a mãe usara, e escaparam-lhe dos pezinhos gelados quando atravessava correndo uma rua para fugir de dois carros que vinham em disparada.
Não pôde achar um dos chinelos e o outro apanhou-o um rapazinho, que saiu correndo, gritando que aquilo ia servir de berço aos seus filhos quando os tivesse. A menina continuou a andar, agora com os pés nus e gelados. Levava no avental velhinho uma porção de pacotes de fósforos. Tinha na mão uma caixinha: não conseguira vender uma só em todo o dia, e ninguém lhe dera uma esmola — nem um só cruzeiro.
Assim, morta de fome e de frio, ia se arrastando penosamente, vencida pelo cansaço e desânimo — a imagem viva da miséria.
Os flocos de neve caíam, pesados, sobre os lindos cachos louros que lhe emolduravam graciosamente o rosto; mas a menina nem dava por isso. Via, pelas janelas das casas, as luzes que brilhavam lá dentro. Sentia-se na rua um cheiro bom de pato assado — era a véspera de Natal —; isso sim, ela não esquecia.
Achou um canto, formado pela saliência de uma casa, e acocorou-se ali, com os pés encolhidos, para abrigá-los ao calor do corpo; mas cada vez sentia mais frio. Não se animava a voltar para casa, porque não tinha vendido uma única caixinha de fósforos, e não ganhara um vintém. Era certo que levaria algumas lambadas. Além disso, em sua casa fazia tanto frio como na rua, pois só havia o abrigo do telhado, e por ele entrava uivando o vento, apesar dos trapos e das palhas com que lhe tinham tapado as enormes frestas.
Tinha as mãozinhas tão geladas... estavam duras de frio. Quem sabe se acendendo um daqueles fósforos pequeninos sentiria algum calor? Se se animasse a tirar um ao menos da caixinha, e riscá-lo na parede para acendê-lo... Ritch!. Como estalou, e faiscou, antes de pegar fogo!
Deu uma chama quente, bem clara, e parecia mesmo uma vela quando ela o abrigou com a mão. E era uma vela esquisita aquela! Pareceu-lhe logo que estava sentada diante de uma grande estufa, de pés e maçanetas de bronze polido. Ardia nela um fogo magnífico, que espalhava suave calor. E a meninazinha ia estendendo os pés enregelados, para aquecê-los, e... tss! Apagou-se o clarão! Sumiu-se a estufa, tão quentinha, e ali ficou ela, no seu canto gelado, com um fósforo apagado na mão. Só via a parede escura e fria.
Riscou outro. Onde batia a luz, a parede tornava-se transparente como um véu, e ela via tudo lá dentro da sala. Estava posta a mesa. Sobre a toalha alvíssima via-se, fumegando entre toda aquela porcelana tão fina, um belo pato assado, recheado de maçãs e ameixas. Mas o melhor de tudo foi que o pato saltou do prato, e, com a faca ainda cravada nas costas, foi indo pelo assoalho direto à menina, que estava com tanta fome, e...
Mas — o que foi aquilo? No mesmo instante acabou-se o fósforo, e ela tornou a ver somente a parede nua e fria na noite escura. Riscou outro fósforo, e àquela luz resplandecente viu-se sentada debaixo de uma linda árvore de Natal! Oh! Era muito maior e mais ricamente decorada do que aquela que vira, naquele mesmo Natal, ao espiar pela porta de vidro da casa do negociante rico. Entre os galhos, milhares de velinhas. Estampas coloridas, como as que via nas vitrinas das lojas, olhavam para ela. A criança estendeu os braços diante de tantos esplendores, e então, então... apagou-se o fósforo. Todas as luzinhas da árvore de Natal foram subindo, subindo, mais alto, cada vez mais alto, e de repente ela viu que eram estrelas, que cintilavam no céu. Mas uma caiu, lá de cima, deixando uma esteira de poeira luminosa no caminho.
— Morreu alguém — disse a criança.
Porque sua avó, a única pessoa que a amara no mundo, e que já estava morta, lhe dizia sempre que, quando uma estrela desce, é que uma alma subiu para o céu.
Agora ela acendeu outro fósforo; e desta vez foi a avó quem lhe apareceu, a sua boa avó, sorridente e luminosa, no esplendor da luz.
— Vovó! — gritou a pobre menina. Leva-me contigo... Já sei que, quando o fósforo se apagar, tu vais desaparecer, como sumiram a estufa quente, o pato assado e a linda árvore de Natal!
E a coitadinha pôs-se a riscar na parede todos os fósforos da caixa, para que a avó não se desvanecesse. E eles ardiam com tamanho brilho, que parecia dia, e nunca ela vira a vovó tão grandiosa, nem tão bela! E ela tomou a neta nos braços, e voaram ambas, em um halo de luz e de alegria, mais alto, e mais alto, e mais longe... longe da Terra, para um lugar, lá em cima, onde não há mais frio, nem fome, nem sede, nem dor, nem medo, porque elas estavam, agora, no céu com Deus.
A luz fria da madrugada achou a menina sentada no canto, entre as casas, com as faces coradas e um sorriso de felicidade. Morta. Morta de frio, na noite de Natal.
A luz do Natal iluminou o pequenino corpo, ainda sentado no canto, com a mãozinha cheia de fósforos queimados.
— Sem dúvida, ela quis aquecer-se — diziam.
Mas... ninguém soube que lindas visões, que visões maravilhosas lhe povoaram os últimos momentos, nem com que júbilo tinha entrado com a avó nas glórias do Natal no Paraíso.


A história O vagalume, eu ouvi pela primeira vez, não faz nem um mês. Foi no aniversário de um ano de meu pequeno Joaquim. Minha querida amiga e excelente contadora de histórias Tania Antunes, veio de Araçatuba para as comemorações e nos presenteou com esta e outras belíssimas histórias.

Foto 2. link http://adeilsonsalles.blogspot.com.br/2009/09/o-vaga-lume-e-o-incompetente.html


O Vagalume

Os insetos juntamente com outros animais foram até uma gruta em Belém visitar o menino Jesus. O insetos param na entrada e Jesus vendo-os faz um sinal com a mãozinha e os chama. Os insetos vão voando pra lá, cada um levando o seu presente. 

A lagarta levou um fio da mais linda e fina seda a borboleta levou a beleza das cores a abelha levou o doce mel a formiga levou um grão de trigo a mosca prometeu velar o sono de Jesus mas sem zumbidos desagradáveis e a vespa prometeu não ferruar ninguém somente um inseto não entrou, porque ele não tinha nada a dar a Jesus, mas ele tinha uma enorme vontade de dizer a Jesus o quanto o amava e já estava de cabeça baixa e triste indo embora quando Jesus falou: Hei você pequeno inseto venha até aqui. 
O inseto rapidamente voou e foi parar na mão de Jesus e a emoção era tanta que uma lágrima grossa e brilhante rolou até a outra mão de Jesus e nesse momento um raio de luar iluminou toda gruta, transformando essa lágrima numa gota de luz. Então Jesus pega essa gota coloca no inseto e diz: De hoje em diante você vai brilhar pra sempre e o seu nome será VAGALUME.


Vagalume tem tem, seu pai tá aqui sua mãe também. (4 x)



E a terceira história, também ouvi da boca da Tania Antunes, quando nos conhecemos em 2008 no Encontro Nacional de Contadores de Histórias de Santa Bárbara D' Oeste. Bom, agora não é segredo nenhum que essa minha amiga me inspira muito, né? Este conto é da tradição oral e já vi várias versões. A versão abaixo é da Bia Bedran (maravilhosa contadora de histórias).



O rei, o pescador e o anel


Foto 3. O rei, o pescador e o anel Sarau na UMAPAZ, dez/2010



Era uma vez um velho pescador que vivia cantando:
Canto: Viva Deus e ninguém mais / Quando Deus não quer / ninguém nada faz.

Mesmo quando sua pesca não era boa, ele cantava com muita fé e alegria a sua cantiga.
Canto: Viva Deus e ninguém mais / Quando Deus não quer / ninguém nada faz.

Um dia, o rei daquele lugar soube da existência do pescador e quis que ele fosse à sua presença, por não admitir que Deus podia mais que tudo no mundo... Esse rei era tão poderoso e orgulhoso, que achava que podia até mais que o próprio Deus!
E lá foi o pescador, subindo as escadas de tapete vermelho do palácio, cantando:  Viva Deus...

Diante do rei, o pescador não mostrou medo algum, e ainda reafirmou sua fé, cantando a mesma cantiga.
Então o rei disse:
Rei: Vamos verse Deus pode mais que eu, pescador!
Eis aqui o meu anel. Vou entregá-lo aos seus cuidados!
Se dentro de 15 dias você me devolver o anel, intacto, você ganhará um enorme tesouro, e não precisará mais trabalhar para viver.
Porém, se no 15° dia você não voltar com o anel, mando cortar a sua cabeça! Agora vá embora...
O pescador foi embora e na volta pra casa, cantava: Viva Deus...

Quando chegou em casa entregou o anel para a mulher que prometeu guardá-lo a sete chaves. Deixe estar que isso não passava de um plano do rei, que logo mandou um criado disfarçado de mercador, bater na casa do pescador, quando esteja havia saído para pescar.
Criado disfarçado: Ó de casa!
A velha senhora abriu a porta.
Criado: Minha senhora, sou mercador. Vendo e compro anéis. A senhora não teria aí pelas gavetas um anelzlnho para me vender? Pago bem!
E mostrou muito dinheiro.
Velha: Não tenho não senhor. Aqui é casa de pobre. Não tem anel nenhum não.
Mas a velha ficou surpresa com tanto que o homem mostrava.
Acabou caindo na tentação, e vendeu o anel!

No fim do dia, o pescador voltou pra  casa cantando:  Viva Deus...

...Quando chegou em casa, soube do que havia acontecido e ficou desesperado.
Pescador: Mulher! Você não vendeu o anel não; você vendeu minha cabeça!
E foram correndo procurar o mercador pela floresta, pela estrada, pela praia, pela aldeia e nada...
Claro! À essa altura, o criado disfarçado de mercador já estava longe, e havia jogado o anel em alto mar, a mando do rei, para que nunca mais ninguém pudesse encontrá-lo.
E: o tempo foi passando...
Décimo dia...
O pescador, triste continuava cantando: (mais lento) Viva Deus...
Décimo primeiro dia...
E o pescador cantando e pescando...
Canto: (ainda mais lento) Viva Deus...

Até que no penúltimo dia, o pescador chamou a mulher e disse:
Pescador: Mulher, eu vou morrer... Amanhã, minha cabeça vai rolar. Vamos nos despedir, com uma última refeição. Farei uma boa pescaria. E lá foi o pescador, tristemente, cantando sem parar sua cantiga.
Canto: Viva Deus... (muito triste)

Foto 4. O rei, o pescador e o anel, Projeto Encontros do metrô


Pescou 50 peixes, 49 ele vendeu no mercado, e 1 levou para mulher preparar.
Ela caprichou no tempero e fez no fogão de lenha, aquele peixe que seria sua última ceia junto com o marido depois de tantos anos. Mastiga daqui, chora dali, pensa de lá, e de repente...
Pescador: (Se engasgando) O que é isso? Mulher (cospe o anel).
Eu não disse que Deus pode mais que todo o mundo?
Canto(bem animado): Viva Deus...

O pescador limpou o anel, e correu em direção ao palácio. Subiu a escadas de tapete vermelho cantando, fez uma reverência para rei, que perguntou todo poderoso:
Rei: E então, pescador? Aonde está o meu anel?
E o pescador, vitorioso:
Pescador: Está aqui, meu rei!
O rei ficou boquiaberto! Não conseguia acreditar...Teve de entregar o tesouro para o pescador. E até o rei teve que cantar:
Canto: Viva Deus e ninguém mais / Quando Deus não quer / Ninguém nada faz.

O pinheirinho de Natal
Foto 5. link http://www.joseroberval.com.br/2010/10/o-simbilismo-mistico-da-arvore-de-natal.html

Conta a história que na noite de Natal, junto ao presépio, se encontravam três árvores: Uma tamareira, uma oliveira e um pinheiro. As três árvores ao verem Jesus nascer, quiseram oferecer-lhe um presente. A oliveira foi a primeira a oferecer, dando ao menino Jesus as suas azeitonas. A tamareira, logo a seguir, ofereceu-lhe as suas doces tâmaras. Mas o pinheiro como não tinha nada para oferecer, ficou muito infeliz.As estrelas do céu, vendo a tristeza do pinheiro, que nada tinha para dar ao menino Jesus, decidiram descer e pousar sobre os seus galhos, iluminando e adornando o pinheiro que assim se ofereceu ao menino Jesus.


Lindas histórias, não é mesmo? 

Desejo que estas histórias inspirem vocês a construir seus sonhos com persistência e alegria.

O ano novo traz uma promessa!



Abraços com carinho,


Rosita Flores

 



quinta-feira, 5 de dezembro de 2013

O GRANDE MERGULHO - ESPETÁCULO TEATRAL

Boa tarde, amigos da Cia Duo Encantado!


Venho fazer-lhes um convite para assistirem a peça baseada no livro O pato, a morte e a tulipa. Texto delicado e belíssimo que trata de tema tão profundo e necessário.

Vejam que beleza de cenário!



Foto do Espetáculo: O pato, a morte e a tulipa




Espetáculo teatral baseado no livro "O Pato, a Morte e a Tulipa" de Wolf Erlbruch. Para crianças de todas as idades.

SINOPSE: Um pato encontra a Morte e, depois do susto, torna-se amigo dela. Juntos, a ave e a simpática personagem aprendem sobre as coisas boas  da vida, como a amizade e as brincadeiras.
Direção: Gabriela Winter Com: Alexandre Acquiste e Aldemir Lima
Duração: 50 minutos
Curta temporada! 
De 07 a 22 de dezembro - Sábados e Domingos às 16hs -no Teatro do Centro da Terra Rua  Piracuama 19  - Perdizes - SP/SP Tel. 3675-1595

Um grande abraço e desejo de sucesso para o amigo Alexandre Acquiste e elenco.

Rosita Flores

quinta-feira, 21 de novembro de 2013

Curso Livre - Contador de Histórias SENAC


Boas tardes, minha gente!

 Faz um tempo que não escrevo aqui. Como vocês sabem, estou com um bebê ( o Joaquim completou, no dia 18/11, um aninho) e também estou trabalhando muito espalhando histórias por aí.

Em breve, muito breve, vou me reorganizar para postar coisas novas por aqui - cantigas, brincadeiras, histórias e também atualizá-los sobre as andanças da Cia Duo Encantado e das minhas caminhadas solo.

Hoje, venho convidá-los a participar e/ou ajudar na divulgação de um curso que vou ministrar em dezembro no SENAC Aclimação. Trata-se de uma formação para contadores de histórias. Serão encontros diários, durante uma semana, no período noturno. Posso dizer, de antemão, que vão ser momentos de muita troca de conhecimentos e reflexões, brincadeiras e cantigas em roda. Isso eu já sei, porque estou com um grupo em andamento, com encontros aos sábados. Como foi tudo muito em cima da hora, não tive tempo de divulgar por aqui. Em breve, colocarei fotos e comentários sobre este processo.

Agradeço muito se puderem ajudar na divulgação. 


Um grande abraço,

Rosita Flores


domingo, 18 de agosto de 2013

OS MÚSICOS DE BREMEN



Comecei a contar esta história faz pouco mais de um mês e a cada vez que conto, ela se torna mais divertida!

A primeira vez que contei foi na Biblioteca de São Paulo - sucesso total! As crianças se tornaram os personagens da história e na hora da cantoria o público todo soltou a voz.

Resolvi colocá-la no repertório de minhas apresentações de agosto no Projeto Encontros do Metrô de São Paulo, nas estações Paraíso e Corínthians-Itaquera e o resultado não foi diferente. Neste caso, os personagens foram todos adultos que, como as crianças, se divertiram bastante, relinchando, latindo, miando ou cantando.


A Cláudia Romano foi a gata da história em uma das apresentações e, para minha alegria, ela enviou um pequeno relato dessa sua experiência (estação Paraíso do metrô no dia 07/08, 13h).

"Olá Rosita, hoje você me fez ser uma gata bem manhosa e velha..rsrsr na hora do meu almoço, e olha que nem cheguei atrasada na minha aula cheguei na pinta da hora. foi maravilhoso o que vc fez linda história e forma de conta-lá. Obrigado pela felicidade que me deu sem eu pedir assim de graça. "Belezura" Cláudia Romano

Quer se divertir também? Junte-se com três ou quatro amigos e brinque com essa deliciosa história.

Os músicos de Bremen


Era uma vez, um fazendeiro que tinha um burro muito prestativo e fiel. Esse burro sempre serviu muito o fazendeiro. Levava em seu lombo todo o trigo colhido na lavoura até o moinho e saía do moinho com pesados sacos de farinha que levava até o mercado da cidade. O burro fez esse serviço todo durante muitos e muitos anos e muito bem. Só que os anos passados foram sendo sentidos em seus ossos e músculos e o burrinho, no momento desta passagem, não conseguia mais realizar todos esses trabalhos com a mesma agilidade de antes.

O fazendeiro, por causa disso, tinha planos de mandá-lo embora pra bem longe e pra sempre. O velho burro descobriu os planos do fazendeiro e ficou muito triste por ter a sua lealdade paga com tamanha ingratidão. Ele não queria ir embora, nem pra bem longe e nem pra sempre. Mas, não tinha a menor ideia de como sair desta situação. Na verdade, o burro acreditava que o fazendeiro queria era matá-lo.

Então, bem a noitinha, o burro deitou-se de barriga pra cima, no pasto verdinho e ficou olhando para o céu. Lá no alto a lua brilhava bonita e grandona. Era lua cheia. O burro fechou os olhos e falou com a lua:

- Preciso achar uma solução. Oh lua que está tão brilhante e grande no céu me ajude a achar uma saída. E assim que o burro abriu os olhos, já sabia exatamente o que fazer.

Iria fugir para Bremen e se tornar músico. Assim como ele pensou, assim ele fez. Saltou a cerca dos arredores do pasto com uma alegria e um vigor que há muito tinha perdido e se viu do outro lado, na estrada, completamente livre, leve e solto.Estava tão feliz o burro, que começou a cantar:

"Eu vou, eu vou, pra Bremen agora eu vou, lálálálá...eu vou, eu vou"

E foi mesmo seguindo na estrada em direção à Bremen. Ele andou, andou e bem lá adiante viu algo na beira da estrada. Chegou mais perto e viu que era um cachorro muito velho e muito triste e então ele perguntou:

- Por que está tão triste, velho cachorro?

E o cachorro respondeu que não conseguia mais vigiar o rebanho de seu dono como fazia quando era jovem e cheio de energia e, por isso, ele seria levado embora pra bem longe e pra sempre.

-O mesmo aconteceu comigo e decidi fugir pra Bremen e me tornar músico. Quer ir comigo? Perguntou o burro.

- Ah! Que maravilha, respondeu o cachorro. É claro que eu aceito.

E quem quer que passasse na estrada rumo à Bremen ouviria um velho burro seguido por um velho cachorro, cantando assim:

"Eu vou, eu vou, pra Bremen agora eu vou, lálálálá...eu vou, eu vou"

Os dois andaram, andaram e depois de muito andar avistaram alguma coisa bem perto de um matagal. Era uma velha gata, muito velha e muito triste. O burro quando chegou bem perto dela, perguntou:

- Por que está tão triste, velha gata?

Ah! Adivinhem o que ela lhe respondeu? Tinha sido abandonada pelo seu dono que não a queria mais só porque ela não conseguia mais caçar os ratos da casa. O dono dela queria levá-la embora pra bem longe e pra sempre. Exatamente como tinha acontecido com o nosso burro da história.

-O mesmo aconteceu conosco, porém decidimos fugir pra Bremen. Quer vir também?

A gata aceitou na hora e na estrada agora, havia um velho burro, seguido por um velho cachorro, seguido por uma velha gata e os três alegres, a cantar:

"Eu vou, eu vou, pra Bremen agora eu vou, lálálálá...eu vou, eu vou"

Os animais andaram, andaram e depois de muito andar avistaram alguma coisa ciscando lá adiante. Era um velho galo. Muito velho e muito triste.

- Por que está tão triste, velho galo? Foi logo perguntando o burro.

E a resposta foi a mesminha dos outros animais:

- Meu dono quer me mandar pra bem longe e pra sempre. Eu não consigo mais acordar cedinho e acordá-lo com meu canto. Estou muito velho e cansado.

O burro lhe disse que tanto ele, quanto o cachorro e também a gata, tinham sofrido de tamanha ingratidão porém, estavam decididos a mudar o destino de suas vidas fugindo para Bremen onde pretendiam se tornar músicos. O burro convidou o velho galo para acompanhá-los.

E a resposta, acho que você já pode adivinhar, não é?

O velho galo aceitou na hora, sem delongas. E os quatro animais seguiam felizes a cantar pela estrada que realizaria seu sonho de vida nova e boa:

"Eu vou, eu vou, pra Bremen agora eu vou, lálálálá...eu vou, eu vou"

E os quatro animais recém amigos andaram, andaram, andaram e foram ficando cansados e com  fome. Foi aí que decidiram encontrar algum bom lugar para descansar (comida era difícil de encontrar).

E então eles andaram e andaram mais um pouco e encontraram um lugar que parecia bom e até certo ponto aconchegante: um lindo e exuberante carvalho, muito alto e com uma copa bem bonita. Cada um dos bichos foi logo buscando um lugarzinho aprazível. O burro juntou umas folhas secas, as arrumou e logo se deitou. O cachorro se enrolou todo e encostou o corpo no tronco da árvore. A gata, manhosa e sabida, se encostou no cão. E o galo como vocês já podem imaginar, se empoleirou num tronco bem lá no alto.

A noite estava bem bonita.

Passado algum tempo, o cachorro já roncava e a gata ronronava, o galo cantou lá de cima e seus amigos acordaram.

- Vejo uma luzinha bem adiante. Parece uma casa ou algo assim. O que acham, meus amigos, de seguirmos até lá? Quem sabe encontramos alguma comida e água? disse o galo.

Os animais pensaram que poderia ser uma boa ideia e decidiram caminhar mais um pouco, em direção àquela luz.

Andaram e logo chegaram ao lugar. Era mesmo uma casinha de madeira e pequenina. Ouviram uns ruídos vindo de dentro e, por um pequeno buraco da madeira o burro olhou dentro. E o que ele viu foi de alegrar todo mundo. O burro notou que na sala havia uma mesa repleta de comida e bebida. Porém, viu também sete ladrões que sentados ao redor da mesa, para tristeza de todo mundo.

No mesmo instante, o burro olhou para o céu e a lua brilhava linda, redonda e grandona. Ele fechou os olhos e  mesmo em oração e pediu:

Oh lua, você que brilha tão grande no céu, me me ajude a achar uma saída. E assim que o burro abriu os olhos, já sabia exatamente o que fazer.

-Tenho um plano - ele disse.

O burro ficou de pé, com as patas dianteiras apoiadas no parapeito da janela e falou:

- Cachorro, suba nas minhas costas! Gata, suba nas costas do cachorro. Galo, suba nas costas da gata e, quando eu der um sinal, vamos todos começar a fazer música com muita força.

Feito isso, estavam todos prontos para entrar em ação. O burro deu o sinal e a música começou bem forte.

O velho burro urrava com toda a sua força, o velho cachorro latia bem alto, a velha gata miava muito e o velho galo cantava bem alto. Fizeram tamanho barulho que as vidraças tremeram até se estilhaçar em muitos pedaços. O galo voo para dentro da casa e começo a bicar os ladrões. Foi seguido pela gata que distribuiu unhadas. Depois veio o cachorro mordendo quem encontrasse, e por último o burro entrou aos trambolhões e começou uma sessão de coices. Era um salve-se quem puder. Dentro da casa a luz estava fraca e, na penumbra não dava para ver nada direito. Com aquele barulho todo provocado pelos animais, os ladrões se assustaram e acreditaram que um grande monstro estava querendo pegá-los. Os sete ladrões foram saindo, apavorados da casa, derrubando tudo que encontravam pela frente e fugiram pela floresta afora. Nunca mais voltaram.

O burro e seus amigos comeram e beberam até não mais poder. E quando terminaram estavam bem satisfeito e puseram-se a buscar um bom lugar para tirar uma soneca.

O burro se acomodou em cima de um monte de palha, a gata se enrolou perto da lareira, o cachorro ficou em um tapete perto da porta e o galo se empoleirou numa viga do teto.

No dia seguinte, eles acordaram descansados e alegres. Admiraram a vista linda que tinha o lugar e decidiram morar lá para sempre. Todos os dias pela manhã, bem cedinho, os quatro amigos caminhavam até Bremen que não ficava muito longe dali, não. Caminhavam alegres a cantar:

"Eu vou, eu vou, pra Bremen agora eu vou, lálálálá...eu vou, eu vou"

E assim fizeram por muito tempo. Estudaram muito e se tornaram músicos talentosos e famosos.

Ah! E antes que eu me esqueça de dizer, na cidade de Bremen, na Alemanha, o prefeito mandou fazer uma estátua bem bonita representando os quatro animais: um burro e em suas costas um cachorro, e nas costas deste uma gata e nas costas dela, um galo. Foi uma maneira de homenagear os quatro velhos animais que conseguiram fugir da morte e, caminhando pelo mundo afora, encontraram uma nova vida de alegria, amizade e muita música.

Recontado em versão livre por mim, Rosita Flores.

Versão conhecida pelos Contos dos Irmãos Grimm

Recomendo a versão encontrada no livro Contos de Animais do mundo todo, Naomi Adler. Com belíssimas ilustrações de Amanda Hall. Editora Martins Fontes, São Paulo, 2007.










quinta-feira, 23 de maio de 2013

Entre Contos, Brincadeiras e Peripécias do Boi Bumbá e outras histórias

Feira do Livro, Biblioteca de São Paulo e Virada Cultural na Casa das Rosas


"No fio das histórias, como no fio da vida, cada um tece o seu tapete..."
em A palavra do contador de histórias
Gislayne Avelar de Mato pág 17

A semana que passou foi bastante agitada para mim. Na segunda-feira contei histórias para os pequenos de idade entre dois e oito anos, do Colégio Maria Imaculada, na Feira de Livros. Desde a semana anterior eu estava entre os preparativos: escolhendo as histórias, os possíveis recursos e tudo o mais.



   Foto 1. Catirina buchuda - crédito da foto Casa das Rosas
A partir da terça-feira, o meu envolvimento total foi com as apresentações que seriam no final de semana da Virada Cultural. Aliás, toda a pesquisa de histórias, versões, recursos, elementos, cantigas, começou bem antes - mais de um mês de antecedência. Mas, a última semana foi essencial para desatar alguns nós que teimavam e também para fazer os ajustes que faltavam. Até ensaio na rua fizemos. Foi bom ver a reação das pessoas que observavam nas varandas, portões e janelas.

Na sexta-feira após o ensaio que terminou por volta das quatro da tarde (começamos às onze horas) fui levar o Boi para a Casa das Rosas para a apresentação de domingo.

No sábado fomos contar histórias na Biblioteca de São Paulo e foi muito especial! Contei as histórias de autores alemães. Da pequena toupeira que queria saber quem tinha feito cocô na cabeça dela, A grande questão e O pato, a morte e a tulipa. Foi bem gostosa a interação que surgiu. Os livros ora abriam espaços para comentários, olhares e indagações de fora. Ora serviam como preenchimentos para as interrogações e emoções de dentro.

Aos poucos o público foi se tornando uno. Dava para notar os olhares e expressões que contagiava os presentes. O livro com toda sua magia - ilustrações, beleza de formato, textura, etc -  foi o substrato para a germinação da teia simbólica onde as sensações, os sentimentos, as emoções e a oralidade se estabeleceram e foram sendo construídos com a e pela narrativa.

Cheguei em casa exausta. Porém, o trabalho ainda não tinha terminado. Aproveitei para tirar um cochilo breve e depois fui terminar de organizar tudo para o dia seguinte: apresentação de Entre Contos, Brincadeiras e Peripécias do Boi Bumbá na Casa das Rosas. Lá pelas tantas pude "pregar o olho" e descansar com alegria e expectativa.

                                                                                           Foto 2. As crianças ajudando  o Boi Pintadinho
                                                                                                                          Crédito da foto: Ana Lu Sanches

O domingo começou cedo. Banho e mama para o Joca. Banho e café da manhã e partimos para a Casa das Rosas. Antes, passei na casa de minha mãe que ficou com o pequeno durante todo o tempo. Santa Mãe, grata por tudo sempre.

Ajustes de som, microfones, figurino, exercícios vocais, passagens das músicas: Ufa! Começa logo - era o que eu pensava. E começou! Às 14:30h com uma platéia linda, dia com um sol suave na pele, jardim verde exuberante da Casa das Rosas, e nós chegamos com o boizinho.

A cantiga de chegança começava: " Chegô , chegô, chegô levantando poeira. As moça  baterô  palma quando viram a brincadeira. Inté panharam rosa oi, no gaio da roseira"

Pétalas de rosas dançavam no ar enquanto colhíamos sorrisos. O Boi que foi brincado e gingado pelo Hélio Francisco seguia encantando as crianças, enquanto a sanfona do Ítalo Magno e a zabumba do Giba Santana lançavam a sonoridade que envolveu a todos numa brincadeira e dança únicas.



                                Foto 3. Boi Pintadinho (Hélio Francisco): Giba Santana, Rosita Flores e Ítalo Magno
                                Crédito da foto: Ana Lu Sanches


AGRADECIMENTOS ESPECIAIS: AO GRUPO BEIJA FULÔ DO QUAL TENHO A HONRA DE FAZER PARTE  POR TER GENTILMENTE CEDIDO O BOIZINHO ; À TODO PESSOAL DA CASA DAS ROSAS (PRODUÇÃO, ORGANIZAÇÃO, E EM ESPECIAL À CAMILA FELTRE E CAROL); AOS MEUS PAIS; AO MEU PEQUENO JOCA QUE É TÃO COMPREENSIVO NAS MINHAS AUSÊNCIAS; À ANA LU SANCHES PELOS CLICS INCRÍVEIS; AOS CHAPÉUS EMPRESTADOS DO GRUPO CORDÃO DA TERRA, AOS AMIGOS E TODOS OS PRESENTES QUE SE DIVERTIRAM COM A GENTE E FIZERAM A TARDE DE DOMINGO FICAR TÃO GOSTOSA. AO ÍTALO E HÉLIO POR TEREM PARTICIPADO DESTA HISTÓRIA COM O DUO ENCANTADO.


Abraços de alegria

Rosita Flores












O desenho daquele menino



"O importante não é a casa onde moramos. 
Mas onde em nós, a casa mora."
Avô Mariano (do livro Um rio chamado tempo, uma casa chamada terra de Mia Couto, Ed. Cia das Letras)

No sábado contei histórias na Biblioteca de São Paulo e foi muito especial!

Eu me diverti com as crianças que estavam muito atentas e participativas. Senti muita receptividade e cumplicidade entre os presentes.
Ao final, no momento em que eu já estava guardando minhas coisas, veio um menino até mim e mostrou um desenho. Ele disse: "Olha o desenho que eu fiz, tia."



No desenho dele tinha um sol entre nuvens, um homem e uma mulher com mãos que quase se tocavam.

Eu elogiei o desenho e perguntei quem eram aquelas pessoas. O menino respondeu: "Meu pai e minha mãe."
Eu perguntei se os pais estavam com ele e então, o garoto disse que só o pai, a mãe não morava ali.

Ficamos conversando por um tempo e eu quis saber porque ele próprio não estava no desenho e a resposta foi, com olhos baixos e voz triste: "Ah! Eu esqueci...Tem também meu irmão que eu esqueci".

Ele tinha feito o desenho para dar de presente ao pai.
Perguntei se ele não queria se desenhar ali e o irmão também, e ele disse que o faria. Pegou o desenho decidido e se foi.

Eu também fui. Levei minhas coisas até o camarim, troquei de roupa, bebi água e quando já estava indo embora, senti um aperto no coração, uma vontade de voltar para ver o desenho daquele menino.Como se eu precisasse disso para sentir que não o havia abandonado (ou me abandonado?).

Entrei novamente na biblioteca e o procurei. Meus olhos o encontraram desenhando. Ele estava sentado numa pequena mesa junto com outras crianças que também desenhavam. Quando chamei por ele que me olhou com olhos brilhantes. Bem, assim foi que eu percebi ou talvez tenham sido os meus olhos que brilharam para ele - nele - com ele.

Ele já havia entregado o desenho ao pai. Pedi para ver e ele foi me guiando pelo corredor da biblioteca até onde se achava seu pai. O corredor era estreito e pequeno. No caminho ficamos lado a lado sem dizer palavra, só expectativa.
Chegamos.  O pai usava um computador da biblioteca e foi logo se desculpando, porque o filho é que tinha que usar.  Porém, o pai se acalmou quando percebeu que eu tinha ido até lá para ver o desenho do menino.

O pai puxou aquele papel sulfite e retirou-o debaixo de algo. Eu não prestei atenção no "algo". Eu queria ver o desenho. Agora eu tinha o desenho do menino nas mãos: um sol entre nuvens, um homem e uma mulher de mãos que quase se tocavam e dois meninos no canto direito. Os irmãos estavam num canto bem separados dos pais. Entretanto, muito próximos um do outro, naquele canto à direita do papel sulfite quase se fundiam num único menino.

Fiquei ali sem saber o que silenciar ou o que pronunciar. As palavras escorreram pelo chão, se esconderam nos livros daquela biblioteca, se trancaram em pensamentos. E porque eu não tinha mais palavra alguma, fiquei ali olhando o desenho, o pai estava em pé, mãos nos bolsos, querendo que aquela situação acabasse. Sorria amarelado e sem graça.

Eu me despedi do pai olhando para o desenho do menino, para o menino que eu via no desenho e para a lembrança que eu tinha do menino.

Naquela tarde eu contei histórias de Wolf Erlbruch, duas delas foram: A grande questão e O pato, a morte e a tulipa.

Contar histórias é entrar em contato com o íntimo das pessoas. Por isso é tão transformador e profundamente perturbador.


Rosita Flores

sexta-feira, 3 de maio de 2013

Dica de Leitura - Metamorfose por Completude




A Ficção Científica como Encontro de Perspectivas


Criar mundos, estruturar contextos, tecnologias, civilizações, comportamentos, ambientes e tudo mais que combinações multidisciplinares habilitam imaginar é um prazeroso exercício de ideação, ainda mais quando ficamos cientes de que essa capacidade de transitar entre diversas áreas do conhecimento e da cultura elaborando cenários sem fim, é um dos elos comuns que nos une a todas as pessoas pelo mundo.  
A história de “Metamorfose por Completude”, uma Ficção Científica, foi escrita tendo sempre em mente a perspectiva de solo comum da humanidade: um único movimento criativo e sem fronteiras, e por isso mesmo de espantosa variedade e ritmos.
Com isso em mente, procurei elementos que pudessem nos fazer ver com mais clareza a necessidade e a urgência de adquirir perspectivas tão amplas quanto abrangentes.   E percebi nesse processo que uma sensibilização dos nossos sentidos e de nossos conceitos pode muito bem desvendar um panorama mais rico de possibilidades que talvez permaneçam unicamente como tal por falta de apreciação e de investigação.
            Desenvolvi então essa história intercalando perspectivas diversas da Física, da Arte, das Teorias da Complexidade e dos Estudos da Consciência, colocando na fala dos personagens um discurso declaradamente não-dualista e de livre-trânsito-entre-temas, discurso este que se desdobra e se estende ao longo da trama nas descrições das composições arquitetônicas dos ambientes das naves alienígenas e dos planetas visitados. E que almeja se estender e incluir o leitor instigando seu imaginário e evocando nele, por uma ressonância de qualidades, uma sensação-percepção-concepção da completude das relações existentes na tecitura infindável desse belíssimo planeta em que vivemos como uma só humanidade - veja também as referências que deram origem à história em:


Panorâmica

“Metamorfose por Completude” é a fascinante história de um primeiro contato da humanidade com alienígenas não-antropóides, que encontram a Terra devido a uma consonância que estabelecem com a condição peculiar na qual nosso planeta se encontra, denominada por eles de “limiar”, condição esta de abertura a inúmeras possibilidades sistêmicas e prenúncio de uma grande transformação.  
Enviando para a humanidade uma miríade de releituras-em-rede-complexa de toda a cultura humana - inúmeras discussões teóricas e soluções práticas para vários problemas enfrentados pela humanidade - os alienígenas propõem um intenso intercâmbio, mas somente se cumprida uma inusitada condição: toda a pobreza deve ser eliminada e todos os problemas ecológicos devem ser resolvidos, tudo num prazo de dois anos e com recursos próprios (da humanidade e do planeta).
A partir desse primeiro contato a história se desenrola em uma viagem a estranhos mundos e a ambientes extraterrestres exuberantes, proposta pelos alienígenas para alguns humanos, recheada de discussões acaloradas sobre a compreensão da relevância das dinâmicas coletivas, e sobre o imperativo que se faz à humanidade a aquisição de uma perspectiva mais abrangente da natureza, da consciência e da cultura.
Postura esta permanentemente adotada pelos alienígenas no decorrer da trama, cuja visão de mundo e perspectiva civilizatória amadurecida por eles ao longo de sua própria história se desdobrou na capacidade de estabelecer uma simbiose multifacetada com seu planeta natal e com suas naves, a ponto de poderem através dessa sintonia, acessar dimensões qualitativamente diferentes da do espaço-tempo comum.
Incitando o imaginário, exercitando um pensar-e-sentir-além-das-fronteiras, a envolvente e instigante história de “Metamorfose por Completude” chama a atenção para a possibilidade de existência de relações-de-conjunto mais abrangentes e profundas do que aquelas comumente consideradas e, do ponto de vista do autor, sutilmente espalhadas na exuberante rede multidimensional estabelecida pela cultura humana.



            O Autor

Carlos Antonio Ragazzo é Físico formado pela UFSCar (Universidade Federal de São Carlos) e um entusiasta da Divulgação Científica. Iniciou-se na Arte com o SenseiMassaoOkinaka da pintura Sumi-ê em 1993. A partir daí aventurou-se no acrílico sobre tela e atualmente dedica-se à Arte Gráfica. Passou a estudar e a praticar Meditação em1988 e segue dedicando-se ao tema e à pratica diária (Zazen) até hoje.
 Este livro é o resultado de sua tentativa de encontrar pontos comuns entre áreas da experiência humana distanciadas por uma visão fragmentada do mundo. A imagem que ilustra a capa desse livro também é de sua autoria e igualmente resultado dessa busca.


Boa leitura!

abraços

Rosita


quarta-feira, 27 de março de 2013

Interfaces entre literatura e empatia



Giovanna Artigiani
            O ser humano é fascinado por histórias – e quem não queria ter uma Sherazade¹ no bolso? A literatura tem o poder de desfocar o mundo do leitor do centro da sua vivência pessoal e mergulhá-lo numa outra realidade completa, na qual o sentimento é o de realmente experimentar o que é estar na pele de outra pessoa, em seu universo complexo, sem limite de tempo e espaço, sem distinção entre o que é real e o que é imaginário. Um exercício de empatia.
            As confissões de Neruda² são ao mesmo tempo um convite para sentir o cheiro do mundo e para sofrer os dramas políticos de seu povo, tanto quanto Graciliano Ramos³ nos resseca a garganta relatando o cotidiano de uma família na seca do Nordeste brasileiro, provocando uma sensação que se pode jurar que é fome, mas que também se parece tanto com angústia. Por meio da literatura, pode-se remoer questões de honra e dúvida com Bentinho e Capitu, de Machado de Assis4, num tempo de rígidas regras teóricas de conduta, e saber como é sentir muito medo com Anne Frank5 escrevendo seu diário escondida do regime nazista durante a Segunda Guerra.
Com frequência, é preciso parar a leitura para acalmar o coração ou secar os olhos, com a possibilidade de, às vezes, convencer-se de que o que fora lido não era verdade, pois muitas vezes é somente uma invenção que nos arrasta ao fundo das sensações. Sozinho, o leitor não poderia sentir os sentimentos dos robôs, como foram propostos por Asimov6, nem relativizar as razões e desrazões dos bichos em revolução de George Orwell7. O imaginário desses autores possibilita-nos alçar voos que exercitam a capacidade de pensar e sentir como um outro alguém que vive em um contexto que nos é estranho. A literatura desloca o centro de equilíbrio dos conceitos próprios e propõe caminhos de emoção que são tão diversos como intocáveis, por outro meio. O autor não entrega tudo; propõe, dá espaço ao imaginário único de cada leitor, que quase se ofende ao perceber que nos filmes baseados em livros – outro leitor, outra leitura – as mesmas palavras escritas formaram outras imagens. Infinitas possibilidades de construção sobre um mesmo alicerce. O leitor pode interagir com o texto em seu íntimo, tanto quanto o texto pode modificar o leitor.
O exercício de empatia que a literatura propõe, com personagens e situações reais ou imaginárias, pode ter uma função social. A literatura permite desenvolver a capacidade de deslocamento do próprio centro de conceitos para o do outro, permitindo uma maior tolerância à diferença. Isso facilita o convívio com outras realidades e oferece acesso ao rol de sentimentos e significados que cada indivíduo, socialmente considerado, pode oferecer.
            O leitor abre o livro e tem o poder de fechá-lo quando precisar respirar na própria realidade para sanar angústia de ser a mulher do médico, com o seu olho numa terra de cegos, tal qual imaginado por Saramago8. Da mesma forma, toca-se a mão de Hemingway9 e experimenta-se o que é ser o velho pescador Santiago, em sua aldeia, em sua aventura de pescar um marlim. O leitor não poderia se aproximar dessa experiência de outra forma, não poderia se emocionar e sofrer com essa luta se não se permitisse seguir o pensamento do autor por meio de suas palavras escritas em ligação direta, sem filtros.
Esse mergulho nos significados do outro, dando medida inclusive de época e contexto histórico, pode transportar o leitor no tempo, oferecendo uma possibilidade de entendimento por imersão, mais do que uma aula ou estudo pode oferecer. O sentimento é de estar em outro tempo histórico, vivenciando seus usos e costumes, filtrado pelas personalidades únicas de cada um dos personagens. Essa experiência pode permitir que, ao fechar do livro, incorpore-se ao leitor a possibilidade de fazer outras leituras do mundo, que modifica e engrandece a sua própria, por aumentar a capacidade de deslocamento do seu entendimento usual acerca dos fatos.
O leitor que se permite montar com Dom Quixote10 no seu fiel cavalo Rocinante e sentir a sua aventura de forma plena poderá, talvez, olhar para as aventuras reais dos seus pares, entendendo que o mundo concreto de cada pessoa é único e singular, e por mais que lhe pareça insano, merece respeito e tolerância.




Referências:
1-      Sherazade, personagem  narradora do Livro das mil e uma noites,que se estima ter sido escrito no século XIII.
2-      Pablo Neruda, no livro Confesso que vivi, publicado em 1974.
3-      Graciliano Ramos, no livro Vidas Secas, escrito no final da década de 1930.
4-      Dom Casmurro, de Machado de Assis, publicado em 1899.
5-      Anne Frank em O diário de Anne Frank, publicado em 1947.
6-      Isaac Asimov, no livro de contos Eu, robô, publicado em 1950.
7-      A revolução dos bichos, de George Orwell, publicado em 1945.
8-      José Saramago, no livro Ensaio sobre a cegueira, publicado em 1995.
9-      Ernest Hemingway, no livro O velho e o mar, publicado em 1952.
10-  Dom Quixote, personagem do livro de mesmo nome, escrito por Miguel de Cervantes e publicado em 1605.